terça-feira, 6 de julho de 2010

A espiritualidade nas artes marciais

Com o advento da Era Tokugawa e a instauração da paz civil no Japão, viu-se florescer o que é hoje, chamado de os budo, em que o sufixo do, enfatiza a prática de uma senda de aperfeiçoamento interior, mais do que uma simples aquisição de técnicas.
Assim , hoje, falamos em Kendo, Iaido, Judô, Karatedo, Aikido...
Vê-se então que, com o tempo, a disciplina guerreira se transformou realmente numa senda de evolução, tendo o guerreiro tomado consciência de que a essência da arte marcial era o amor ao próximo. Para isso foi necessário que ele vencesse a si mesmo e desse prova de coragem e perseverança.

A dificuldade de apresentar a noção de do ( senda) relativamente à de jitsu ( técnica) está na contradição que existe entre o combate com um adversário físico e o combate contra si mesmo. Cada adepto , conforme sua aptidão física, seu temperamento, sua educação ou sua evolução espiritual, tende a privilegiar um ou o outro desses combates. Seja como for, a arte marcial é uma senda régia na qual o praticante é chamado , após um longo e difícil aprendizado, a construir uma obra-prima, como faziam outrora os construtores de catedrais. Mas essa obra-prima, é o próprio ser humano. Nisso o Budo é um caminho iniciático, um trabalho sobre si mesmo, uma ascese interior que deve sempre manter uma ligação com uma filosofia.
É uma prática que tem o objetivo de que o indivíduo se abstenha do que a vida diária tem de violento e frustrante, a fim de alcançar a plenitude. Sua meta é permitir a cada qual o construir-se física, mental e espiritualmente.

Numa primeira etapa, o adepto da arte marcial, deve aprender a defender seu corpo contra todo inimigo, sem apelar para armas, a fim de fortalecer sua mente. Numa segunda etapa, ele precisa descobrir e compreender que a rigidez corporal deve dar lugar à flexibilidade. Quando ele se defronta com uma situação perigosa, o budoka deve sempre manter o sangue frio , graças ao que se pode com razão chamar de autodomínio.
Este só se adquire com o treinamento do corpo e do espírito. Alem disso, ele deve estar em condição , não somente de neutralizar um adversário, mas também de colocá-lo no reto caminho, após ter eliminado nele, o desejo de destruir e tê-lo feito compreender o erro de seu comportamento.

Assim , um dos princípios fundamentais do Budo, assenta na aptidão do indivíduo para viver sem inimigos e com a convicção de que o inimigo não é outro, senão ele próprio.
As artes marciais não são em caso algum , uma apologia da violência e sim um combate contra o ódio para instaurar o amor.
Devemos sempre ter em mente que se o outro continuar a ser nosso inimigo , se não cessarmos de querer nos tornar seu mestre em vista disso, então, estaremos nos equivocando no objetivo maior. Na realidade, o adversário não é o outro; somos nós mesmos. Para sermos mais precisos, é a parte de nós mesmos que nos escapa e que não controlamos. É o nosso ego, no que ele tem de mais negativo.

No Kojiki, antigo livro de lendas japonesas, consta claramente que a arte marcial era, não somente um meio de lutar, mas também um meio de alcançar certa sublimação do espírito e um despertar espiritual.

Izasa Choisai Ienao, prega que uma escola marcial deve propor aos alunos, um ideal de vida, um conhecimento das artes, uma disciplina do caráter e um desabrochar da alma.
O budo é uma escola da vida, com a recusa de uma violência não obstante contida em técnicas que ensinam como infligir a morte.
Àqueles que duvidem de que o budo seja um empenho filosófico, devemos indicar que a palavra dojo tem por origem o vocábulo sânscrito bodhi-manda, que se refere à esfera radiosa e pura que circundava o Buda plenamente desperto. Em seu sentido mais místico, o dojo é então um lugar consagrado onde se pratica um misogi, ou seja, uma purificação do corpo e do espírito, com o fim de alcançar o estado de despertar e verdade.

Citações:
"O Aikido, é uma arte de não violência ativa. Não se procura destruir o adversário, mas levá-lo a uma atitude mais conciliadora. É neste sentido, que se pode falar em envolver seu adversário com o coração." - Michel Soulenq

"Não há combate no Aikido. Um verdadeiro guerreiro é invencível, porque ele ou ela, não combate nada. Agredir significa agredir o espírito de disputa que temos em nós mesmos." - Morihei Ueshiba

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